Nota Prévia: Escolhi este título para uma série de artigos na medida em que julgo ser uma certa crise de modernidade que subjaz ao caos que vai grassando no Belenenses e sobre a qual terei concerteza ocasião de me pronunciar em artigo posterior. Penso também, por outro lado, que o espaço da blogosfera azul sem riscas tem que servir mais, para discutir o clube e falar dele com alguma sensatez e não tanto para debitaitar avulsamente, como se de vómitos se tratassem, frustrações, insultos, aberrações e alarvidades de indole diversa as quais colheriam em absoluto, melhor resultado numa consulta de psicanálise.
No seguimento do artigo anterior e respeitando tanto quanto possível, o fio condutor da lógica de pensamento subjacente a esta série de opiniões despretensiosas, é chegado agora o momento de nos debruçarmos sobre esse celebérrimo conceito do clube–empresa, verdadeira aberração apregoada aos sete ventos.
Na realidade contemporânea é do entendimento comum, a importância que os conhecimentos de Gestão e Administração desempenham nas mais diferentes organizações e nos mais diversificados sectores de actividade.
Se a isso ajuntarmos a sua inestimável importância no plano individual da vida profissional e particular de cada um de nós estamos por certos na posse dos elementos básicos para entender o seu âmbito vital, mas não absoluto.
Necessário se torna contudo advertir que não devemos reduzir o papel da Gestão e da Administração a uma mera contabilidade “merceeira do deve e haver” nem, a simplórios “balanços e balancetes” nem, a ficcionados relatórios de contas os quais acabam sempre por “contar as contas” que quisermos fazer crer.
Os conhecimentos de Gestão e Administração e a sua rara importância, não são coisa de agora, mas de tempos longínquos e de Povos, Impérios e Civilizações anteriores à memória que deles possamos ter. Determinantes por isso, em boa parte, do processo civilizacional e do que este nos permitiu realizar nos mais diversificados sectores de actividade.
Isto para afirmar que, qualquer empreendimento organizacional ou individual, para poder ser bem sucedido tem que, primeiramente, ser pensado (Fase da Concepção); depois e, desejavelmente, deverá ser desenvolvido/implementado (Fase da Planificação); em seguida operacionalizado (Fase da Gestão e Administração) e finalmente aferido nos objectivos atingidos e/ou por ainda atingir (Fase da Avaliação).
Não se vislumbra pois, qualquer possibilidade de sucesso para um projecto que não obedeça a um planeamento estratégico e a uma constante monitorização nas suas diferentes etapas e a uma avaliação final. Só assim podem identificar-se falhas e efectuar acertos durante a operacionalização e fazer a sua retrospectiva final segundo uma óptica de reformulação futura e adaptada aos objectivos prévia ou posteriormente [re]definidos.
A incumbência da Gestão e Administração dos clubes desportivos nomeadamente, dos clubes de futebol é, curiosamente ou, talvez não, feita de modo amiúde mentecapto e ignorante. Talvez isso ajude a perceber o porquê de se falar muito nesse suposto conceito de clube – empresa, mas que todavia, não passa de uma falaciosa realidade.
Um clube, não deverá ser gerido “empresarialmente” pela simples razão que tem uma conjuntura interna e toda uma circunstância institucional, organizacional, social, cultural que ultrapassa a mera tentativa de transplantar a realidade e o modelo empresarial para o clube de futebol.
Sublinhe-se no entanto que, com semelhantes afirmações, não se pretende que um clube de futebol, não deva ter uma Gestão e uma Administração cuidadosa e, mais que cuidadosa, norteada pelo rigor orçamental. Deve, contrariamente, sentir-se obrigado a tê-la. Este carácter rigoroso deve fazer-se também sentir ou impender sobre quem gere e administra. Essa é uma tarefa não pode ser feita de forma amadora e irresponsável por indivíduos, desportivamente, incultos.
Um dirigente desportivo ao mais alto nivel da hierarquia clubística não pode e não deve, ao nível da Gestão e da Administração, ter a arrogância de pensar que, para gerir e administrar, será suficiente saber fazer cálculo matemático e refugiar-se nas fórmulas matemáticas da economia e da gestão financeira. Isso não é, gestão e administração desportiva mas, uma monstruosidade.
Quem gere e administra um clube deve perceber que a Gestão e a Administração são áreas de conhecimento para onde confluem também, conhecimentos fundamentais de outras áreas do saber humano.
Quem gere e administra deve perceber que a Sociologia, a Antropologia, a Psicologia, a Ética, a Teoria da Comunicação, a Comunicação Cultural e o Marketing, as Relações Públicas entre mais uma ou outra área do saber e do conhecimento ajudam, e de que maneira, a acrescentar aos conhecimento economico-financeiros e da actividade gestionária e administrativa, uma indispensável mais valia para conduzir com propriedade e competência os destinos de um clube de futebol ou outro organismo desportivo.
O clube-empresa foi uma invenção de um certo dirigismo ignorante e boçal feito muitas vezes de engenheiros, advogados, empresários e/ou meros mercadores que, inúmeras vezes tentou passar para a gestão de um clube de futebol, a receita de sucesso das suas vidas empresariais. Burrice total!
Ninguém no seu perfeito juízo gere coisas diferentes como se fossem uma e a mesma coisa. O diferente é incomparável...por isso mesmo é diferente e não igual. A realidade sócio-cultural e a implantação de um clube de futebol, não é a mesma que a de uma empresa; os seus objectivos são completamente diferentes embora nem um nem outro possam dispensar-se de rigor orçamental, mas também aqui existem nuances a considerar.
Considere-se a título de exemplo a aquisição de um jogador mais caro a qual pode inflacionar o orçamento, mas produzir resultados positivos, não só, desportiva quanto financeiramente, com a transacção a posteriori desse jogador para outro clube; já a aquisição de um pacote de jogadores dentro do rigor orçamental, pode ser ruinosa desportiva e financeiramente, em particular se de modo imprudente se arriscar a despromoção de uma Liga Sagres para uma Liga Vitalis.
Gerir pessoas é acima de tudo uma arte. Regra geral o empresário/gestor ignorante da nossa praça dirigente considera as pessoas o maior problema de uma empresa. E percebe-se porquê. Reduz toda a realidade empresarial a uma actividade lucrativa em que o lucro é fim em si mesmo e as pessoas só atrapalham. Faz lembrar aquela anedota do indivíduo que chega virgem aos quarenta anos e tem a primeira experiência sexual com uma boneca insuflável. Burrice total outra vez!
Cada vez mais o sucesso nas empresas depende da qualidade do relacionamento humano entre chefias e na hierarquia e na motivação adicional que daí decorre para quem ajuda a garantir e a consolidar as metas de produção. Governar ou gerir/dirigir contra alguma coisa ou contra alguém é uma das melhores maneiras de fazer falir um investimento.
É um pouco (MUITO) aquilo que tem sucedido e continua a suceder, pesem embora algumas (POUCAS) boas vontades, no Belenenses. Não se gere nem administra o clube pelo clube e para o clube. Mas contra ele. Os resultados estão bem visíveis.
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Tempos Modernos (IV - A)
Publicado por Nuno Gomes @ 7.10.08 Etiquetas: CFB - (Série) "Tempos Modernos", Miguel Taveira