DE COMO HOJE, VOLVIDOS VÁRIOS MESES, A “FÁBULA DO CONTENTOR” JÁ É SÓ PARA ENGANAR TÓTÓS ou AS VERDADEIRAS CIRCUNSTÂNCIAS DA DESCIDA DO BELÉM 2008-2009

Recebemos e passamos a publicar um artigo de opinião de um consócio que pediu para não ser identificado.

Para drama de alguns (mencionados adiante) e indiferença de outros (idem), o nosso Belém vai descer este ano. Nada que espante, aliás, coisa há muito preconizada ao ponto de já estar inclusivamente atribuída e passada em julgado por todos os quadrantes – internos e externos - a questão da CULPA. A saber: a culpa foi do Fernando Sequeira e do “contentor” de Brasileiros. Para esta verdade oficial, a jusante deste acto infame são tudo inocentes e vítimas.

Mas, comecemos pelo fim: a dolorosa certeza da descida num momento em que ainda faltam 10 jogos e está tudo matematicamente em aberto percebe-se, sem esforço, nos segundos após a derrota caseira contra a poderosíssima Naval Primeiro de Maio. Enquanto os tipos da Naval pulam pelo campo a celebrar, no centro do relvado, com um ar de cachorrinhos desamparados a precisar de “festinhas”, perfilam-se os jogadores (salvo seja) do Belém, formando uma espécie de círculo de amizade e amparo comum que, para quem não tivesse visto o que se passou antes, até pareceria comovedor. Jaime Pacheco, treinador que, num passado muito, muito, distante, granjeou fama de duro, aproxima-se e, num gesto de ternura, começa a acariciar a face de cada um dos infelizes. Os cachorrinhos continuam de beiça baixa até que, finalmente, aqueles 30 ou 40 tipos, normalmente dos cativos de cima ao meio, e que aplaudiria mesmo que tivéssemos levado 72 a 0 dos juvenis do Massamá, porque o que é importante é estarmos vivos, lhes batem as palminhas do costume. Os restantes saíram e já nem assobiam. Com isto, pode o grupo retirar-se até às cabines, tomar banho, gozar a sua folga e preparar-se para mais uma Santa semana de trabalho.

Ora, regressemos à questão da culpa oficial – a fábula do “contentor”.
O “contentor” foi um acto máximo de incompetência, não há dúvida. E isso precipitou uma má época. Quanto a isso, estamos conversados (embora sobre Fernando Sequeira se deva dizer mais ou menos o mesmo que se diz sobre o Carciano, isto é: a culpa não é dele, mas de quem lá o pôs!!). Mas, volvidos vários meses e vários jogos depois das alterações que ocorreram, é tempo de largarmos a fábula e passarmos a ser empíricos, sérios e objectivos. Vamos, assim, a algumas verdades:

Verdade nº 1: do famoso “contentor”, no jogo de hoje contra a Naval, só jogaram a titulares 2 (dois) jogadores, tendo entrado posteriormente um terceiro;

Verdade nº 2: pode haver a ilusão de que até tivemos algumas oportunidades neste jogo. Verdade. Mas, com uma nuance: todas, sem excepção, saíram dos pés de um jogador do “contentor” – Vinicius. Por outras palavras, não fosse Vinicius, que, por acaso, até é do “contentor”, não teríamos criado uma única jogada de perigo. Aliás, isto não é de agora, mas sim de há muito tempo. Vinicius é o único jogador desta equipa digno desse nome. Por isso falha golos, alternando com outros que dá a marcar, sendo fácil de ver que é único que leva a equipa para a frente e dá, verdadeiramente, o corpo ao manifesto. É o único com algum brio de futebolista, com a ambição de ter a bola, de fazer algo com ela e de se tentar suplantar aos adversários. Portanto, vistas as coisas a uma nova luz, começa a parecer estranha a fábula, quando o único real alimentador do nosso futebol provém, precisamente, do “contentor”;

Verdade nº 3: esta coisa de caminhar a fazer beicinho para a descida não é nova no passado recente deste clube. Voltemos ao círculo de amizade e de carinho no final do jogo de hoje com a Naval. Não vos é familiar? Aquilo não vos diz nada? Então, não se lembram de Barcelos e daquele nosso jogador, coitado, que pôs as mãos na cabeça no dia em que aí descemos, num gesto teatral para enganar burros, querendo fazer crer que só naquela altura é que tinha percebido que tinha descido? Pois, é o actual capitão de equipa! Valor seguro do futebol Português (até podia ter dado o salto para um Grande, coitado), mártir do mau toque de bola do contentor, partilha com o nosso treinador a paixão pelo Futebol de 5. E pratica-a sempre que pode, infelizmente para nós, até no relvado do Restelo. Como é dos que tem lugar cativo, e até parece que treina a equipa lá do bairro, cumula a prática intensiva do toque curto e bola no pé em espaços inofensivos do relvado (normalmente com inerente perda da mesma para os adversários – esses Brutos do futebol de 11) com indicações constantes para os colegas sobre as melhores opções de passe (não sendo obviamente ele uma delas, visto que, mais que não seja, se encontra demasiado ocupado, de costas para a baliza, a identificá-las!). Em vez de jogador de futebol de 11, que manifestamente não é (não obstante alguma técnica de controle de bola que possui – típica, aliás, do futebol de 5), será qualquer coisa entre um adjunto volante no relvado ou, numa feliz expressão que não é minha – Polícia Sinaleiro. Ou seja, por aqui, verdade nº 3, jogamos com um a menos. Mais do que o “contentor”, começam a surgir as verdadeiras causas da nossa descida.

Verdade nº 4: a verdade nº 3 não é totalmente verdadeira. É que nós não jogamos com um, mas com dois a menos. Falo do escudeiro do Polícia Sinaleiro, outra Relíquia vilipendiada pelos Hunos do contentor – o inigualável José Pedro. Bom, Zé Pedro tem um bom remate. Erradamente, também se considerou (normalmente uma coisa puxa a outra) que é bom a centrar e a passar bolas. Mentira. Ou, pelo menos, hoje, é, de certeza, mentira. Prova irrefutável é que dos 77 cruzamentos deste ano (72 dos quais de bola parada e que normalmente significam a perda de 2 minutos de jogo em cada um que é o tempo que demora a arrastar-se até ao local de cobrança) nenhum criou perigo. Como, entre outras prerrogativas feudais desta equipa (a que, para nossa desgraça, Pacheco não pôs cobro) tem o pelouro exclusivo da marcação de todos os livres não directos, metade dos directos e de metade dos cantos, isso significa para nós duas coisas: i) 4/6 das nossas bolas paradas dão em nada (os restantes 2/6 são para esbanjar pelo Polícia Sinaleiro) e ii) contamos com vários minutos de tempos mortos no nosso ataque e os nossos adversários com uma confortável quantidade de pausas que ajudam imenso quem defende. Mas isto nem é o pior. O pior é a completa ausência de mobilidade, capacidade de retenção de bola, concentração, capacidade de pressão de Zé Pedro. Se o Polícia Sinaleiro sofre de disfunção futebolística de futebol de 5, Zé Pedro ainda é pior, pois assenta a sua matriz no conhecido jogo dos matraquilhos. Nem mais. Zé Pedro está no relvado como o 4º boneco da esquerda do meio campo de um jogo de matraquilhos está em qualquer taberna. O seu pé esquerdo pode ser fulminante, mas o seu raio de acção não ultrapassa (na proporção para o jogo de matraquilhos e já com boa vontade) cerca de 4 ou 5 metros. Fora desse local, acontece a Zé Pedro o mesmo que aconteceria a qualquer matraquilho que desatarrachassem do ferro. Nos últimos tempos, ciente destes perigos, mais experiente e maduro, Zé Pedro já nem sai. Não obstante, tem o seu feudo garantido na equipa. Mas, ZP nem sempre foi assim. Basta recordar o jogo em Munique. Foi todo o terreno, com desarmes, recepções na queima, dribles e carrinhos por todo o lado. Aí, o pé esquerdo tornou-se uma arma a sério. Noutros jogos, fez golos históricos, mas, este ano acabou. A forma que tem é a prova disso mesmo. Como é possível, ao 20º jogo de uma época, um profissional de futebol ter a condição física e competitiva deplorável que ele tem?! Porquê? Por falta de vontade, falta de entrega, falta de se querer entregar à equipa, falta de se querer deitar melhor jogador do que quando acordou. Culpa dele e de quem isso permite porque está cheio de mesuras e complexos de o pôr no banco ou na bancada!!

Enfim, as verdades colocam-nos na rota da descoberta do porquê da descida. A fonte do problema não é o contentor.

Mas, também não são, individualmente, o Polícia Sinaleiro e/ou o Matraquilho. O problema é a forma como a equipa consente esses dois feudos e aceita jogar dentro das apertadas prerrogativas dos seus dois Lordes. É aí que está o problema. É verdade que a defesa é a pior da história do clube e está a ser reconstruída praticamente do 0. Mas seria possível a manutenção, muito mais agora, que se vai começando a solidificar a defesa, se à frente dela existisse VIDA no futebol do Belenenses. Não era preciso craques. Era preciso sim, uma cultura de entrega e de vontade de jogar o futebol de 11 moderno, ou seja, cada jogador joga no limite em cada jogada, em qualquer posição no campo, mesmo que não a sua, começa-se a sprintar no inicio e acaba-se ao minuto 90. Joga-se com humildade em função dos problemas que o jogo vai criando, com vontade de os resolver e não amuados, porque a bola fugiu do raio de acção de 5 metros ou não foi devidamente acariciada como se faz no futebol de 5 ou o passe não foi feito segundo a sinalética do “PS”. Mas, não existe. O Polícia Sinaleiro e o Matraquilho pautam o jogo à sua imagem e semelhança. O expoente máximo é a forma como vão conversar aquando da marcação de alguns cantos. Vai para lá um marcar o canto e outro vai para ao pé dele conversar. Toda agente sabe no estádio que não vão marcar canto curto, até porque nenhum deles tem sprint para sair dali com bola e ir centrar mais perto da baliza. Os defesas sabem isso e já nem se aproximam. A conversa significa apenas um jogador nosso a menos na área ou na zona de ressaca. Os adversários agradecem e o Pacheco come isto tudo impávido e sereno! Várias coisas negativas vêm por arrasto. Alguns exemplos: Os trincos, que normalmente surgem na frente a desequilibrar, encolhem-se; Marcelo, ponta de lança com boas qualidades, já se reduziu à arte do mergulho, de nada valendo as vezes sem conta que Vinicius ganha a linha; Wender exige a si próprio uma condição física apenas 5 por cento menos deplorável que Zé Pedro e, por isso, chega a fazer impressão ver as dificuldades aeróbicas que tem no relvado. A equipa é uma manta de retalhos e de lamentações. Vinicius e o Polícia Sinaleiro chocam no relvado e param a discutir enquanto o adversário galopa em direcção à nossa baliza nas suas costas, Zé Pedro vira as costas a um colega que está a tentar lançar uma bola e não tem linha de passe e por aí em diante.

Ganhamos a quem com uma cultura destas?
Quando vi Pacheco chegar ao Belém suspirei de alívio porque pensei: não obstante as imensas carências que temos, há, pelo menos, uma coisa garantida – a equipa exibirá níveis competitivos dignos do futebol moderno. Dentro desta lógica, confiava que, pelo menos, suplantássemos duas equipas em que isso não acontecesse, o que não é difícil no futebol Português. E que, para a próxima época reconstruíssemos tudo do zero, segundo a matriz que julgava ser a do Pacheco. Era esta a minha esperança.

Meus Deus, como me enganei!! Os feudos continuam e a falta de competitividade mantém-se em níveis que talvez já só por ilusão se podem considerar um pouco menos patéticos que os do tempo do Casimiro Mior. Aqui e ali, quando as coisas correm de feição, exibe-se o tal “algum futebol” (primeira parte contra o Leixões, 7 minutos da segunda contra o Sporting), mas a inconsistência desses fogachos vê-se a olho nu.

Regressemos ao princípio: a descida vai doer.
Pois vai. Mas, a quem? Ao Polícia Sinaleiro e ao Matraquilho? Não. A culpa, aliás, foi do contentor e há sempre aqueles 40 para bater palmas e o ordenado ao fim do mês (mesmo que seja atrasado e para o ano seja reduzido para jogar na Vitalis – é que, além deste no Belém, não se vislumbra outro no horizonte!). A história do futebol guardará a forma estóica como suportaram no balneário aqueles Brasileiros do Ipatinga que lá puseram.
Ao contentor? Não. Aliás, a maior parte dele já cá nem está.
Ao Vinicius? Não. O Jesus e o Salvador chamar-lhe-ão um figo. Vai uma aposta?
Aos cardeais e diáconos que lutarão pelo poder no clube (exactamente os mesmos que fugiram a sete pés deixando o Sequeira ganhar sozinho)? Também não.
Descidas já houve muitas e o importante, se calhar, é aproveitar para reavivar as “Secções”.
Ao Jaime Pacheco? Também não. É verdade que, se as coisas corressem bem, o Belém era uma excelente rampa de relançamento, mas, paciência, a vida continua noutro clube qualquer e toda a gente sabe que a culpa foi do contentor. Desde já, por antecipação, agradeço os discursos de grande amor ao clube que se proferirão no final. Sempre será mais reconfortante que a indiferença do Couceiro.

Vai doer então a quem? Vai doer aos mesmos a quem doeu em Barcelos. Àqueles que são Belém e que arrastam outros para serem Belém e que, como não conseguem aplaudir descidas, nem se refugiar nas secções, não têm como explicar àqueles que arrastaram porque é que o fizeram. Esses terão a amarga tarefa de conviver com essa culpa e não há contentor que lhes valha!