Morreu o Último Oleiro Belenense e Desapareceu o Rodalho...



Porque será que nós temos
na frente, aos montes, aos molhos,
tantas coisas que não vemos
nem mesmo perto dos olhos?

(António Aleixo)

longe vão os tempos da madorna e calmaria,
homens, eram mesmo homens, fosse noite ou dia.
possuíam olhar de lince e faces tranquilas,
formatando outros homens, prá rudeza da vida.

talvez fossem oleiros! talvez fossem sonhadores!
pedalando sem descanso, até pareciam geradores.
debruçados sobre o rodalho, circulando sem cessar,
olhos fixos no barro e na peça a moldar.

e fabricaram marinheiros, pescadores ou almirantes,
soldadesca de fibra, capitães e comandantes.
e fabricaram homens simples, trabalhadores inveterados,
que se esqueciam das horas, pra darem conta dos recados.

possuíam o raro don, de sorrir às dificuldades,
eram talhados com fibra, dispensavam a vaidade.
não temiam desafios, não vacilavam com o vento,
sofriam noites a fio, mas venciam os tormentos.

erguendo a mais bela história, desportiva de Portugal,
três vezes recomeçada do zero, porque tinham um ideal.

raramente havia lamentos, muito menos espavento,
eram oleiros doutros tempos, eram seara azul contra o vento.

hoje cantam-se muitos zeros, todos à esquerdo do cifrão,
e no totobola da vaidade, nada fizeram! e de férias vão.
depois queixam-se dos inêxitos, calímeros das notícias pimba,
borradas, atrás de borradas, fotos tremidas, mas garantidas!

morreu o último oleiro azul!
e ainda ninguém deu por isso.

mas que importa ao pagode?
habituaram-se ao prejuízo!

JAN