Kanimambo, Valente Ngwenya...

Monstros Grandes, comendo monstros pequenos, 1961

A notícia colhe-nos de chofre pela declaração brutal e fria : ... morreu devido a doença prolongada, aos 74 anos, Malangatana, internado desde alguns dias numa unidade hospitalar de Matosinhos ...

Foi-se o pintor da Matalana nascido em 1936 numa região de etnia Ronga, foi-se o jacaré(ngwenya), nome herdado de seu pai, originário da África do Sul e de etnia zulu.

Deixou orfãos os seus amigos Craveirinha e Mia Couto. Saravá Doutor Honoris Causa da Universidade de Évora.

Acabam-se os quadros de beleza ímpar do mestre do surreal e do figurativo Moçambicano, único na arte de "talhar" sobre tela com os seus pínceis, obras meio humanas, meio bichos com as suas unhacas brancas, que remetiam para o homem inteligente, o porquê de tanta cobiça, de tanta morte, de tanta miséria, num continente tão ricamente empobrecido.

Para legado ficam todas essas obras extra ordinárias, mais os seus murais, as suas esculturas de ferro e as poesias, espalhadas um pouco por todo o mundo, em museus públicos e privados, ou em casa de alguns previligeados.

Malangatana Valente Ngwenya, ex pastor de gado, ex nyamussoro (médico tradicional), ex criado de meninos, ex apanhador de bolas, deixou-nos de forma simples, tal como entrara nos nossos corações.

São assim os Homens Bons, Valorosos e Sábios! Dispensam as trombetas e os arautos...
Está mais pobre a Cultura Lusófona. Moçambique perdeu um dos seus Maiores.

Apagaram-se as sonoras e sinceras gargalhadas, terminaram os abraços vigorosos com que brindava os amigos ....

Infelizmente, de imediato reatará outra "alhada-das-antigas", agora com o nosso Grande Matateu, que deve estar a esfregar as mãos de contente, porque recomeçarão duras e sonoras discussões celestiais, mal passe os portões da Casa dos Heróis Imortais, porque estes são os únicos Moçambicanos com o raro privilégio de possuírem os maiores imbomdeiros da terra natal, onde brincaram outros "coroados reis", mas sem direito a trono imbondeiral.

Caloroso Abração a todos os meus amigos Moçambicanos pela irreparável perda. Kanimambo!

Ao bom evangelho dos cassetetes
ouvir avoengos pássaros bantos
cantarem algures nos ombros
velhas melodias de feridas.

E depois
à sedutora persuasão das ameaças
pela décima segunda vez humildemente
pensar: Não sou luso-ultramarino
SOU MOÇAMBICANO!

Será suficiente esta confissão
sr. chefe dos cassetetes
da 2ª brigada?
(Craveirinha)

chico feio, espancador mor da pide, 1965